Conforme aponta relatório do The Global E-waste Monitor 2020, apenas em 2019, aproximadamente 53,6 milhões de toneladas de aparelhos eletroeletrônicos foram descartados, revelando um crescimento de 21% em comparação aos 5 anos anteriores. Desses materiais, apenas 17,4% foram reciclados, tornando-se novamente matéria-prima para outros produtos.
O Brasil assume posição de destaque (negativo) neste quesito, sendo o quinto país que mais gerou lixo eletrônico no ano de 2019, tendo produzido mais de 2 milhões de toneladas de lixo eletrônico, ficando atrás apenas da China, Estados Unidos, Índia e Japão. Assim, se considerarmos apenas a América Latina, o Brasil lidera o ranking com folga.
Nesse contexto, a logística reversa de produtos eletroeletrônicos, implementada pelo Decreto 10.240/2020, assume fundamental relevância, pois busca estabelecer um sistema de descarte responsável destes produtos para que possam ser reciclados, visando a preservação do meio ambiente e a sustentabilidade dos recursos naturais.
Dessa forma, é importante que todas as empresas que atuam na fabricação, importação, distribuição e comercialização de produtos eletroeletrônicos estejam cientes das suas responsabilidades no sistema de logística reversa desses materiais, que estão definidas no Decreto 10.240/2020, sob pena de sofrer prejuízos a partir da aplicação de sanções previstas no caso de descumprimento da norma.
Ficou interessado em entender como o Decreto 10.240/2020 se aplica à sua empresa? Não se preocupe! Vamos explicar, daquele jeitinho descomplicado que você já conhece, tudo o que você precisa saber sobre a logística reversa de produtos eletroeletrônicos.
E para cumprir com nossa missão de descomplicar o conhecimento jurídico, trataremos do assunto com leveza e traçaremos paralelos com o excelente filme Wall-e, da Pixar.
Ah, e fique com a gente até o final do artigo, pois você receberá uma dica bônus exclusiva que vai explicar detalhadamente como funciona a participação do consumidor no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos. Não deixe de conferir!
1 – O que é a logística reversa de produtos eletroeletrônicos e qual a sua importância?
A logística reversa de produtos eletroeletrônicos, regulamentada pelo Decreto 10.240/2020, nada mais é do que o sistema que viabiliza o descarte, transporte, manejo e reciclagem destes bens de consumo, com a finalidade de que sejam novamente convertidos em matéria-prima para a indústria.
Dessa forma, a partir da união de esforços dos fabricantes, distribuidores, comerciantes e consumidores, além daqueles que realizam a reciclagem propriamente dita, é possível dar destinação ambientalmente adequada aos produtos. Isso porque o descarte indevido dos produtos eletroeletrônicos, além de causarem prejuízos ao meio ambiente, impossibilita que seu potencial econômico seja novamente explorado.
O filme Wall-e retrata o cenário que poderia ocorrer se essa medida não fosse tomada. Uma Terra pós-apocalíptica que, por ação humana, ficou completamente entulhada de lixo. A humanidade, impossibilitada de sobreviver nessas condições, deixou o planeta e passou a viver em uma gigantesca nave. Para que pudessem voltar em alguns anos, foram deixados robôs para limpar o planeta.
É fato que boa parte dos recursos naturais não são renováveis, estando sujeitos, portanto, à crescente escassez. Diante disso, não é exagero afirmar que é cada vez mais necessário pensar em estratégias de economia desses recursos, principalmente porque não estamos em uma situação fácil de mandar todos os habitantes da Terra para outros planetas, não é?
O modelo de produção linear é, por consequência direta, extremamente negativo aos recursos naturais, uma vez que se pauta na constante extração e descarte, sem a reutilização daqueles materiais que tinham condições de passar pelo processo de reciclagem e reingressarem na economia. Essa lógica ultrapassada, que ignora as possibilidades econômicas oferecidas pela reciclagem, é exatamente o que se busca superar com a logística reversa de produtos eletroeletrônicos.
Nesse contexto, conforme estabelecido pelo Decreto 10.240/2020, a logística reversa de produtos eletroeletrônicos deve ser implementada por intermédio de uma rede de serviços especializados, a fim de que todos os estágios programados pela norma sejam cumpridos de maneira segura.
O Decreto 10.240/2020 disciplina que as empresas de pequeno, médio e grande porte que importam, fabricam, distribuem ou comercializam eletroeletrônicos de uso domiciliar, precisam implementar um sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos.
2 – Minha empresa é obrigada a implementar um sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos?
O Decreto 10.240/2020 disciplina que as empresas de pequeno, médio e grande porte que importam, fabricam, distribuem ou comercializam eletroeletrônicos de uso domiciliar, precisam implementar um sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos.
Assim, a empresa não precisa ser gigantesca como a Buy n Large apresentada em Wall-e para enquadrar-se nas obrigações previstas no Decreto, bastando estar inserida na cadeia de produção de eletroeletrônicos.
Vale ressaltar que a obrigatoriedade de implementação da logística reversa já era prevista na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), de 2010. Entretanto, enquanto a PNRS estabelece obrigações para todos aqueles que consomem produtos objetos de logística reversa, o Decreto 10.240/2020 trata especificamente acerca dos produtos eletroeletrônicos e seus componentes de uso doméstico.
Nessa perspectiva, o Decreto 10.240/2020 estabelece que a responsabilidade das empresas e das entidades gestoras será avaliada de forma individualizada, mediante a análise do cumprimento das suas obrigações pelo órgão responsável.
Assim, caso a empresa descumpra as obrigações previstas no Decreto 10.240/2020, de forma injustificada, estará sujeita às sanções administrativas, civis e penais previstas na legislação, observadas as competências fiscalizatórias do órgão competente do Sisnama, conforme estabelece o art. 65 da norma.
3 – Qual a diferença entre o PGRS e a logística reversa de produtos eletroeletrônicos implementada pelo Decreto 10.240/2020?
“Minha empresa já tem um Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS). Preciso implementar um sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos mesmo assim?”
Sim! Como ambos têm por finalidade o gerenciamento responsável e adequado dos resíduos produzidos, é compreensível que haja certa confusão entre o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos e as disposições do Decreto 10.240/2020. Entretanto, a principal diferença entre o documento e o Decreto está na área de atuação.
Enquanto o sistema implementado pelo Decreto nº 10.240/2020 estabelece as diretrizes a serem respeitadas pelos fabricantes, importadores, comerciantes e consumidores de produtos eletroeletrônicos de uso domiciliar, o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS) trata sobre os resíduos gerados pelas empresas em sua planta fabril, ou aqueles que não sejam equivalentes aos de uso doméstico.
Mais especificamente, as disposições do Decreto nº 10.240/2020 tratam sobre a logística reversa de produtos eletroeletrônicos de uso doméstico, que devem ser seguidas não apenas pelos fabricantes, importadores e comerciantes, como também pelos próprios consumidores destes materiais.
Já o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS), é um documento obrigatório, exigido pelo art. 20 da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), consistente num relatório detalhado dos resíduos sólidos gerados na atividade da empresa.
Em outras palavras, a empresa, além de respeitar as diretrizes estabelecidas pelo Decreto 10.240/2020, implementando um sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos de uso doméstico, para receber de volta os produtos descartados pelos consumidores, pode ser obrigada a manter um Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos, caso se encaixe nas situações que exigem a adoção de ambas as providências.
Assim, o Decreto 10.240/2020 levaria a Buy n Large a lidar com o recolhimento e reaproveitamento de todos os bens eletrônicos que produzia, enquanto o Plano de Gerenciamento obrigaria a empresa a produzir um relatório com compromissos como não mais descartar no espaço o lixo produzido na nave Axiom.
4 – Como funcionam as fases de implementação da logística reversa de produtos eletroeletrônicos?
Conforme o Decreto 10.240/2020, os prazos para estruturação e implementação da logística reversa de produtos eletroeletrônicos foram divididos, basicamente, em duas fases. A primeira fase teve vigência entre 12/02/2020 e 31/12/2020, com a segunda fase tendo iniciado a partir de 1º/01/2021.
Nesse sentido, a primeira fase foi destinada, de maneira geral, à adaptação das empresas, que deveriam identificar sua função dentro do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, estruturando suas atividades e ferramentas de atuação no processo de coleta e destinação dos materiais, seja de forma individual ou coletiva, por meio de acordos com empresas gestoras.
Ainda nessa fase, foi criado o Grupo de Acompanhamento de Performance (GAP), formado por entidades representativas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes. Podemos citar, dentre os objetivos e funções do GAP, o acompanhamento da implementação do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, além da própria divulgação do sistema.
A segunda fase, que está vigente no momento, é destinada ao funcionamento propriamente dito do sistema de logística reversa de produtos eletrônicos. A partir dela, é possível que as empresas que não estão adequadas sejam responsabilizadas, podendo sofrer sanções, como o arbitramento de multa (como já explicamos em tópico anterior).
Além disso, o Decreto 10.240/2020 estabelece, a partir do primeiro ano de implementação efetiva do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, serão estabelecidas metas anuais crescentes de coleta e destinação final destes materiais, que tem por finalidade alcançar, até 2025, a reciclagem de 17%, em peso, da produção de 2018, conforme o infográfico abaixo:
Mas não para por aí! O Decreto 10.240/2020 abre margem para o recebimento de aditivos, de modo que, para os anos posteriores a 2025, serão estabelecidas novas metas. Assim, o ano de 2020 foi destinado à estruturação das empresas, enquanto o ano de 2021 e seguintes foram dedicados à implementação do sistema, devendo as empresas escolherem um modelo coletivo (através de entidades gestoras) ou individual de logística reversa de produtos eletroeletrônicos.
5 – Quais as obrigações das empresas no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos?
O Decreto 10.240/2020 estabelece uma série de obrigações para as empresas no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, sejam elas fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes destes materiais.
Vale ressaltar que o sistema funciona de maneira encadeada, de modo que, para que ele funcione da maneira correta, todos os participantes envolvidos precisam executar suas atribuições com responsabilidade.
Assim, são obrigações dos fabricantes e dos importadores, no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, nos termos do Decreto 10.240/2020:
- Dar destinação final ambientalmente adequada, preferencialmente para reciclagem, a cem por cento dos produtos eletroeletrônicos que forem recebidos pelo sistema;
- Informar ao Grupo de Acompanhamento de Performance os critérios objetivos para a realização do cálculo do balanço de massa de produtos eletroeletrônicos;
- Participar da execução dos planos de comunicação e de educação ambiental não formal;
- Disponibilizar aos órgãos integrantes do Sisnama, quando solicitado, o relatório para verificação do cumprimento das ações de sua responsabilidade.
Nesse contexto, é importante reiterar que, conforme estabelece o Decreto 10.240/2020, as obrigações dos fabricantes e importadores participantes do sistema coletivo de logística reversa de produtos eletroeletrônicos serão cumpridas por meio de entidades gestoras.
O Decreto 10.240/2020 também descreve obrigações exclusivas dos importadores no âmbito do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos. São elas:
- Participar de um sistema de logística reversa como requisito de conformidade para a importação e comercialização dos produtos eletroeletrônicos;
- Fazer constar da Declaração de Importação para as autoridades competentes, a informação do responsável por estruturar, implementar e operacionalizar o sistema de logística reversa do importador.
Cumpre mencionar que é requisito de concessão da licença de importação de produtos eletroeletrônicos informar na Declaração de Importação qual o responsável pela logística reversa do importador, de modo que é uma das responsabilidades que merece maior atenção.
As atribuições dos distribuidores, como participantes do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos, também estão dispostas no art. 35 do Decreto 10.240/2020, sendo elas:
- Incentivar a adesão às entidades gestoras ou à participação individual ao sistema de logística reversa dos estabelecimentos varejistas que façam parte de sua cadeia comercial;
- Informar aos estabelecimentos varejistas que façam parte de sua cadeia comercial sobre o processo de operacionalização do sistema de logística reversa;
- Disponibilizar ou custear os espaços físicos para os pontos de consolidação a serem utilizados no sistema de logística reversa;
- Disponibilizar, quando solicitado pelos órgãos integrantes do Sisnama, relatório para verificação do cumprimento das ações de sua responsabilidade.
Dessa forma, dentre as funções dos distribuidores, podemos definir como principais as de informar e incentivar a adesão dos varejistas ao sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos. Vale ressaltar que o incentivo dos varejistas à adesão às entidades gestoras ou à participação individual pode ser realizado por meio das entidades representativas dos distribuidores ou por meio de acordos ou contratos.
Por fim, o Decreto 10.240/2020 estabelece a função dos comerciantes dentro do sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos. Assim, são obrigações dos comerciantes:
- Informar aos consumidores, nos pontos de recebimento, acerca de suas responsabilidades;
- Receber, acondicionar e armazenar temporariamente os produtos eletroeletrônicos descartados pelos consumidores nos pontos de recebimento e efetuar a devolução destes produtos aos fabricantes e aos importadores;
- Participar da execução dos planos de comunicação e de educação ambiental não formal;
- Disponibilizar aos órgãos integrantes do Sisnama, quando solicitado, relatório para verificação do cumprimento das ações de sua responsabilidade.
É importante deixar claro, ainda, que as obrigações dos comerciantes previstas no Decreto 10.240/2020 se aplicam às empresas que comercializam produtos eletroeletrônicos tanto em loja física, como em vendas à distância e por meio de comércio eletrônico, aplicando-se também estas disposições às empresas prestadoras de telefonia móvel que comercializam produtos eletroeletrônicos.
Dica Bônus
Mais um artigo finalizado! E, como de costume, aqui você terá acesso a uma dica bônus exclusiva!
No artigo de hoje, falamos sobre as obrigações e responsabilidades das empresas fabricantes, importadoras, distribuidoras e comerciantes no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos. Mas, como os consumidores se encaixam nesse sistema?
Vale lembrar que, em Wall-E, a “vida” do robozinho se resumia a, diariamente, compactar o lixo que cobre o planeta, que forma verdadeiras montanhas, em uma tarefa árdua e praticamente impossível de se concluir. E essas montanhas não surgiram do nada, mas sim de péssimos hábitos de consumidores acomodados que, mais tarde, sequer conseguiam ficar em pé.
Pensando nisso, e para evitarmos esse futuro distópico(!), preparamos um completíssimo guia de participação do consumidor no sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos!
Você pode acessá-lo aqui: Guia de participação do Consumidor no sistema de Logística Reversa de Produtos Eletroeletrônicos.
Com esse guia, você, consumidor consciente, conseguirá entender todas as suas responsabilidades no sistema implementado pelo Decreto 10.240/2020. Esperamos que seja bastante útil!
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